Inserido na poligonal da Área de Proteção Ambiental (APA) Vale da Avenida Assis Valente, em Cajazeiras X, o Parque Pedra de Xangô foi inaugurado pela Prefeitura, nesta quarta-feira (4), no dia em que completa cinco anos de tombamento do monumento lítico como Patrimônio Cultural da cidade. A solenidade contou com as presenças do prefeito Bruno Reis, gestores municipais e representantes de entidades de matriz africana.
O prefeito destacou a importância do parque para a comunidade e para os adeptos das religiões de matriz africana. “Nunca antes, na história de Salvador, houve uma gestão que se preocupasse tanto com as religiões de matriz africana. Temos aqui todo um trabalho de reconhecimento dos terreiros, isenção de IPTU, cadastro, georreferenciamento e tombamento dos terreiros, além de parcerias para reformas”.
O chefe do Executivo municipal ressaltou ainda que o parque é o primeiro em todo o país que faz referência a um orixá. “Isso só poderia acontecer na primeira capital do Brasil, um lugar com um pluralismo religioso. Com o parque, o tombamento da Pedra fica ainda mais assegurado. O povo de santo precisava de um lugar para suas obrigações, celebrações e demais atividades. E hoje, temos mais um parque, de sete novos que iremos entregar nos próximos anos, sempre respeitando a legislação ambiental”, concluiu Bruno Reis.
Com investimento de quase R$8 milhões, o novo espaço de convivência se constitui como importante símbolo histórico, cultural e religioso de Salvador, além de ser voltado para a conservação ambiental e desenvolvimento sustentável participativo. As intervenções englobam, ainda, a urbanização da Avenida Assis Valente. A via passou por serviços de macrodrenagem, pavimentação asfáltica, construção de meio-fio e passeio em concreto, pavimento em paralelepípedo de granito selecionado, além de 636 m² de espelho d’água.
Tombamento e história
Símbolo sagrado e elemento cultural afro-brasileiro, a Pedra de Xangô foi tombada em maio de 2017 como patrimônio cultural do município. “O monumento é importante pela questão religiosa e também pela questão histórica, já que aqui foi um quilombo e local de culto. Sendo assim, a construção deste parque também faz parte da salvaguarda. Além do primeiro espaço de lazer, também é um novo marco identitário da região de Cajazeiras”, avaliou o presidente da Fundação Gregório de Mattos (FGM), Fernando Guerreiro.
No parecer técnico da FGM, responsável pela iniciativa, houve o entendimento de que a formação rochosa de 8 metros de altura e, aproximadamente, 30 metros de diâmetro, “é considerada um monumento natural, um marco na história de resistência daqueles que sofreram com a escravidão em Salvador, pois, segundo a tradição oral, servia como passagem e esconderijo de quilombolas perseguidos”.
Em 2005, a pedra foi completamente desnudada e por pouco não foi implodida para dar lugar à construção da Avenida Assis Valente. Através do movimento do povo de santo, em 2016, o Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano (PDDU) contemplou a criação do Parque Pedra de Xangô, a APA municipal Vale do Assis Valente e o Parque em Rede Pedra de Xangô, com a finalidade de preservar todas as áreas verdes ainda existentes no entorno.
O livro “Pedra de Xangô: um lugar sagrado afro-brasileiro”, fruto de dissertação de mestrado de Maria Alice Pereira da Silva, defendida no Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal da Bahia (Ufba), traz importantes recortes sobre a história da pedra.
Citando o historiador Stuart B. Schwartz, Maria Alice revela que “o Quilombo Buraco do Tatu, localizado a leste-nordeste da cidade de Salvador, próximo à atual praia de Itapuã – Ipitanga, teve início em 1743 e foi destruído quase vinte anos depois, em 2 de setembro de 1763. Era um mocambo bem estruturado e possuía um sistema de defesa militar engenhosamente definido. Inúmeras trilhas falsas e armadilhas eram utilizadas para confundir as expedições reescravizadoras e facilitar a fuga durante os ataques”, diz um dos trechos da obra.
“Este equipamento representa um ato de reparação histórica. Estamos diante de um sítio natural sagrado afro-brasileiro, uma área remanescente de quilombo e de aldeamento indígena, que atende o desejo de uma comunidade em manter seu legado ancestral, garantindo o livre exercício de culto e manifestações afro-brasileiras e indígenas, conectando esse povo com o sagrado e sua espiritualidade”, explicou Maria Alice Silva.