Missionário é expulso do Acre após tentar converter indígenas isolados

Norte-americano recebeu visto do governo Bolsonaro e se instalou no território do Povo Madija, que possui histórico de suicídio por contato forçado

SEM IMAGEM

O missionário norte-americano Anthony Paul Goddard invadiu uma terra indígena no Acre para dar início a um processo de conversão evangélica forçada com os indígenas da etnia Madija – um povo considerado de recente contato. A informação é do jornalista André Uzêda, do Intercept.

Sem autorização da Funai, ou mesmo de lideranças locais, Anthony Goddard e sua esposa Rachelle Goddard, construíram em março uma casa de 96 metros quadrados e passaram a morar dentro da terra indígena Alto Rio Purus, na aldeia Santo Amaro, próximo a foz do Rio Chandless, que corta o estado. Em maio, eles comunicaram saída à Funai.

Anthony Goddard integra o grupo filantrópico Missões Novas Tribos do Brasil, a MNTB, uma subsidiária da antiga New Tribes Mission – de Sanford, na Flórida –, atual Ethnos 360, organização protestante luterana, que busca converter para o cristianismo povos de várias partes do mundo. “Mais de 6 mil povos do mundo ainda não foram alcançados. Estamos bem com isso?”, questiona a instituição na página em inglês no Instagram.

Página da Ethnos 360 no Instagram.

No governo Bolsonaro, o Ministério da Justiça e Segurança Pública concedeu ao casal Goddard, passe livre no Brasil, onde passou a morar por tempo indeterminado. Este ano, ao descobrir que Goddard e sua família estavam vivendo na terra indígena Madija, a Funai solicitou apoio da Superintendência da Regional da Polícia Federal do Acre para retirá-los do local.

O órgão indigenista se apoiou em uma instrução normativa de 1994, que diz que missões religiosas só poderiam atuar em áreas indígenas se tiverem decisão favorável de um antropólogo – o que não era o caso de Goddard.

Em nota ao Intercept, a MNTB disse que “é uma instituição de longa data, que busca desempenhar um papel significativo através da atuação eclesiástica”. A organização, no entanto, não respondeu se Goddard havia sido orientado a invadir a área pela própria MNTB – tampouco se, após ser notificado pela Funai, teria sido expulso ou punido internamente pela missão evangélica.

Os advogados do missionário também foram procurados pela reportagem, mas eles não responderam. A Funai também foi procurada e informou que enviaria uma resposta – o que acabou não acontecendo.

Contato com brancos elevou suicídio

Em 2017, o Ministério Público Federal descobriu, através de um laudo antropológico, alto número de suicídios dentro da etnia Madija, sobretudo entre homens, de 16 a 28 anos. Segundo o documento, de dezembro de 2015 até fevereiro de 2017, “foram identificados doze casos de suicídio entre os Madija do Alto Purus”. E entre fevereiro e novembro de 2017, foram relatados mais dois casos, “ambos entre indígenas do sexo masculino”.

O laudo não é conclusivo quanto a uma “explicação única, consensual e homogênea” para os suicídios recorrentes, mas aponta hipóteses, entre elas “o uso de interpretações provenientes do cristianismo, devido ao processo de conversão evangélica em curso nas aldeias do Alto Purus”.

O relatório mostrou ainda que as mortes por enforcamento – o método mais usado – são “mais comum nas aldeias com maior presença evangélica” e estão relacionadas a uma crença trazida pelo cristianismo, a partir de uma doença relacionada ao “demônio”, ao “satanás” ou ao “capeta”.

“A presença missionária por si só já gera turbulências e tensões, porque ela interfere nas dinâmicas de sociabilidade. Primeiro, porque ela instala um conflito. Você tem aqueles que aderem ao discurso pregado e aqueles que resistem e mantém as práticas tradicionais. Eu observei que nas aldeias de contato evangélico com mais adesão, a autoridade religiosa, o pajé, era mais confrontado com sua posição questionada pelos demais”, disse ao Intercept o antropólogo Pedro Moutinho, que assina o laudo do MPF.

Clique aqui para ler matéria completa.

Siga a gente no Insta | Face | TwitterYouTube | Whatsapp.

Acompanhe o Panorama da Bahia no Google Notícias e fique sempre bem informado.

Notou algum erro no texto acima? Por favor, nos informe clicando aqui.

Apoie o Panorama da Bahia com qualquer valor e ajude a manter a integridade da nossa linha editorial: pix@panoramadabahia.com.br

Compartilhe:

Facebook
Twitter
LinkedIn
WhatsApp

VEJA TAMBÉM

error: Conteúdo protegido.